Menor tem direito à gratuidade da justiça independentemente da situação econômica dos seus pais? - CL ADVOCACIADF

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Menor tem direito à gratuidade da justiça independentemente da situação econômica dos seus pais?

  Vejamos o que consta da Lei e Julgados dos Tribunais superiores A concessão da gratuidade de justiça deve ter como parâmetro as condiçõe...

 

Vejamos o que consta da Lei e Julgados dos Tribunais superiores

A concessão da gratuidade de justiça deve ter como parâmetro as condições econômico-financeiras da parte efetivamente interessada (autor ou réu da ação) e não de terceiros necessários ao preenchimento do requisito da capacidade processual - assistentes ou representantes processuais. Isso porque o benefício é personalíssimo e concedido analisando caso a caso, não se transmitindo e se extingue pela morte do beneficiário conforme  a Lei (art. 10 da Lei 1.060/ 195o e art. 99§ 6º, do CPC). 

Desta forma, a pessoa do genitor não se confunde com a do filho menor por ele representado ou assistido em juízo, que goza da presunção de hipossuficiência (art. 99§ 3º, do CPC), tendo em vista a sua tenra idade e na ausência de prova de situação financeira favorável para custear as despesas processuais, impõe-se a concessão de justiça gratuita. 

Vale ressaltar ainda lembrar que pela teoria da proteção integral, as crianças e adolescentes estão sujeitos a proteção prioritária, tendo seu acesso ao Judiciário garantido, devendo ser beneficiados com a gratuidade da justiça, conforme expressamente previsto no art. 141 da Lei 8.069/ 1990 - ECA.

Essa conclusão, embora lógica, nem sempre é observada pelo juiz de piso e pelo tribunal estadual, desaguando no Superior Tribunal de Justiça (STJ), de onde colhemos alguns julgados:

Ação: compensação por danos morais ajuizada por criança, representada pelos genitores, em face de supermercado, em razão de ter sido atacado por um cão quando adentrava no estabelecimento, tendo experimentado diversos ferimentos em razão desse fato. Por ser o autor criança e, portanto, não possuir patrimônio nem exercer atividade remunerada, requereu os benefícios da gratuidade, juntando declaração de pobreza. Em decisão interlocutória o juiz indeferiu o pedido, sob o argumento de que os pais da criança possuem boa situação financeira. Em sede de agravo de instrumento o TJ-MG manteve o indeferimento. 

O STJ, no entanto, ao analisar o caso, entendeu que "a representação da criança ou adolescente por seus pais vincula-se à incapacidade civil e econômica do próprio menor, sobre o qual incide a regra do art. 99§ 3º, do CPC/2015, mas isso não implica automaticamente o exame do direito à gratuidade com base na situação financeira dos pais". 

O Colegiado deu provimento ao recurso especial para deferir a justiça gratuita ao recorrente, ressalvado o direito dos recorridos de requerer a revogação do benefício, caso comprovado concretamente que o menor não preencha os requisitos legais para a concessão.

O julgado restou assim ementado:

 

PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE COMPENSAÇÃO POR DANOS MORAIS. GRATUIDADE DE JUSTIÇA. AÇÃO PROPOSTA POR MENOR. EXAME DO DIREITO AO BENEFÍCIO DA GRATUIDADE À LUZ DA SITUAÇÃO ECONÔMICA DOS GENITORES. IMPOSSIBILIDADE. NATUREZA JURÍDICA PERSONALÍSSIMA. PRESSUPOSTOS QUE DEVEM SER PREENCHIDOS PELA PARTE REQUERENTE. 1. Ação de compensação por danos morais ajuizada em 31/12/2021, da qual foi extraído o presente recurso especial interposto em 03/10/2022 e concluso ao gabinete em 09/03/2023. 2. O propósito recursal consiste em definir se é admissível condicionar a concessão da gratuidade de justiça a menor à demonstração de insuficiência de recursos de seu representante legal. 3. O direito ao benefício da gratuidade de justiça possui natureza individual e personalíssima, não podendo ser automaticamente estendido a quem não preencha os pressupostos legais para a sua concessão e, por idêntica razão, não se pode exigir que os pressupostos legais que autorizam a concessão do benefício sejam preenchidos por pessoa distinta da parte, como o seu representante legal. 4. Em se tratando de menores representados pelos seus pais, haverá sempre um forte vínculo entre a situação desses dois diferentes sujeitos de direitos e obrigações, sobretudo em razão da incapacidade civil e econômica do próprio menor, o que não significa dizer, todavia, que se deva automaticamente examinar o direito à gratuidade a que poderia fazer jus o menor à luz da situação financeira de seus pais. 5. Em se tratando de direito à gratuidade de justiça pleiteado por menor, é apropriado que, inicialmente, incida a regra do art. 99§ 3º, do CPC/2015, deferindo-se o benefício ao menor em razão da presunção de insuficiência de recursos decorrente de sua alegação. Fica ressalvada, entretanto, a possibilidade de o réu demonstrar, com base no art. 99§ 2º, do CPC/2015, a ausência dos pressupostos legais que justificam a concessão gratuidade, pleiteando, em razão disso, a revogação do benefício. 6. Na hipótese dos autos, a Corte de origem indeferiu o benefício pleiteado pelo recorrente (menor), consoante o fundamento de que não foi comprovada a hipossuficiência financeira de seus genitores, o que não se releva cabível. 7. Recurso especial conhecido e provido. (STJ, REsp n. 2055363/ MG, relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 13/6/2023, DJe de 23/6/2023 - (Informativo de Jurisprudência nº 781)

Ação: cumprimento de sentença de alimentos (execução de alimentos), proposta pelos filhos menores, representados pela genitora, em face do pai. Decisão interlocutória que negou o diferimento do pagamento das custas processuais ao final do cumprimento, ao fundamento de que não foi comprovada a impossibilidade financeira da representante legal dos menores. Acórdão do TJSP que, por unanimidade, negou-se provimento ao agravo de instrumento nos termos da seguinte ementa: "Agravo de instrumento - alimentos - insurgência contra decisão que indeferiu os benefícios da assistência judiciária - menoridade não faz presumir a impossibilidade financeira de custear o processo - genitora também é responsável financeira dos menores e exerce atividade remunerada - não comprovação do comprometimento da renda com o custeio das despesas essenciais da família - decisão mantida - recurso não provido.

No STJ, o recurso especial foi conhecido e provido no sentido de deferir o benefício da gratuidade da justiça aos filhos menores.

A ministra relatora fez constar em seu voto: "Não é necessário muito mais do que máximas de experiência para concluir que, a despeito de a genitora ser advogada e exercer atividade profissional e remunerada, o inadimplemento do genitor com o custeio das necessidades básicas e vitais dos seus filhos (que, desde então, tem sido sustentados integralmente pela genitora) implica, por óbvio, na redução proporcional do padrão de vida, na privação de determinados bens, usos e costumes e em realocações orçamentárias que se revelam absolutamente compatíveis com a declaração de insuficiência momentânea de recursos. Assim, diante do evidente comprometimento da qualidade de vida dos menores em decorrência do sucessivo inadimplemento das obrigações alimentares pelo genitor, geradoras de cenário tão grave, urgente e de risco iminente, não é minimamente razoável o indeferimento do benefício da gratuidade da justiça aos menores credores dos alimentos, ressalvada, uma vez mais, a possibilidade de impugnação posterior do devedor quanto ao ponto". Eis a ementa de referido julgado:

CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA CONDENATÓRIA DE ALIMENTOS. DIREITO AO BENEFÍCIO DA GRATUIDADE DA JUSTIÇA. NATUREZA INDIVIDUAL E PERSONALÍSSIMA. EXTENSÃO A TERCEIROS. IMPOSSIBILIDADE. EXAME DO PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS AUTORIZADORES A PARTIR DA SITUAÇÃO ECONÔMICA DE PESSOA DISTINTA DA PARTE, COMO A REPRESENTANTE LEGAL DE MENOR. VÍNCULO forte ENTRE DIFERENTES SUJEITOS DE DIREITOS E OBRIGAÇÕES. DEPENDÊNCIA ECONÔMICA DO MENOR. AUTOMÁTICO EXAME DO DIREITO À GRATUIDADE DE TITULARIDADE DO MENOR À LUZ DA SITUAÇÃO ECONÔMICA DOS PAIS. IMPOSSIBILIDADE. CRITÉRIOS. TENSÃO ENTRE a natureza personalíssima do direito E incapacidade econômica do menor. PREVALÊNCIA Da regra do art. 99§ 3º, do novo CPC. ACENTUADA PRESUNÇÃO DE INSUFICIÊNCIA DO MENOR. CONTROLE JURISDICIONAL POSTERIOR. possibilidade. preservação do acesso à justiça e contraditório. relevância do direito material. alimentos. imprescindibilidade da satisfação da dívida. risco grave e iminente aos credores menores. impossibilidade de restrição injustificada ao exercício do direito de ação. representante legal que exerce atividade profissional. valor da obrigação alimentar. irrelevância. 1- Recurso especial interposto em 18/05/2018 e atribuído à Relatora em 13/02/2019. 2- O propósito recursal é definir se, em ação judicial que versa sobre alimentos ajuizada por menor, é admissível que a concessão da gratuidade de justiça esteja condicionada a demonstração de insuficiência de recursos de seu representante legal3- O direito ao benefício da gratuidade de justiça possui natureza individual e personalíssima, não podendo ser automaticamente estendido a quem não preencha os pressupostos legais para a sua concessão e, por idêntica razão, não se pode exigir que os pressupostos legais que autorizam a concessão do benefício sejam preenchidos por pessoa distinta da parte, como o seu representante legal. 4- Em se tratando de menores representados pelos seus pais, haverá sempre um forte vínculo entre a situação desses dois diferentes sujeitos de direitos e obrigações, sobretudo em razão da incapacidade civil e econômica do próprio menor, o que não significa dizer, todavia, que se deva automaticamente examinar o direito à gratuidade a que poderia fazer jus o menor à luz da situação financeira de seus pais. 5- A interpretação que melhor equaliza a tensão entre a natureza personalíssima do direito à gratuidade e a notória incapacidade econômica do menor consiste em aplicar, inicialmente, a regra do art. 99§ 3º, do novo CPC, deferindo-se o benefício ao menor em razão da presunção de sua insuficiência de recursos, ressalvada a possibilidade de o réu demonstrar, com base no art. 99§ 2º, do novo CPC, a posteriori, a ausência dos pressupostos legais que justificam a gratuidade, o que privilegia, a um só tempo, os princípios da inafastabilidade da jurisdição e do contraditório. 6- É igualmente imprescindível que se considere a natureza do direito material que é objeto da ação em que se pleiteia a gratuidade da justiça e, nesse contexto, não há dúvida de que não pode existir restrição injustificada ao exercício do direito de ação em que se busque o adimplemento de obrigação de natureza alimentar. 7- O fato de o representante legal das partes possuir atividade remunerada e o elevado valor da obrigação alimentar que é objeto da execução não podem, por si só, servir de empeço à concessão da gratuidade de justiça aos menores credores dos alimentos. 8- Recurso especial conhecido e provido (STJ. 3ª Turma. REsp 1807216/ SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 04/02/2020. DJe 6/2/2020- Informativo de Jurisprudência nº 664).

No julgamento do AgInt no AREsp nº 2019757/ SP, em 07/06/2022, o Ministro Marco Aurélio Bellize reconsiderou decisão de sua autoria, para dar provimento ao recurso especial e deferir a gratuidade de Justiça à parte que teve o benefício obstado com base no argumento de que o seu representante legal possui condições financeiras capazes de arcar com as custas processuais (STJ, AgInt no AREsp n. 2019757, Ministro Marco Aurélio Bellizze, DJe de 09/06/2022).

Advogado Carlindo Medeiros e a fonte: Superior Tribunal de Justiça Julgados

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